quinta-feira, 16 de abril de 2009

Texto Filosofia/ Sociologia

Aflição do tempo faz parte da história
Maurício Tuffani

A idéia de que o homem vive em conflito com o tempo tem sido constante desde os primórdios da civilização. Na mitologia grega, para evitar que algum de seus filhos o castrasse e o dominasse, do mesmo modo que fizera com seu pai Urano, o deus Cronos (tempo, em grego, conhecido como Saturno pelos romanos) devorou os recém-nascidos à medida que foram paridos por sua mulher, Réia. A “moral da história”, mostrada pelo poeta Hesíodo (séc. 8o a.C.) em sua obra “Teogonia” (origem dos deuses, em grego) é a de que o tempo se encarrega de consumir tudo o que ele mesmo gerou.

Já no início da era cristã, o filósofo latino Sêneca (7 a.C. – 65 d.C.), em uma carta a seu amigo Paulino – a quem tentava convencer que largasse a vida pública para se dedicar à filosofia –, afirmou que o sentimento de que o tempo passa rapidamente não atingia somente os homens das classes inferiores da sociedade, mas também os cidadãos mais ilustres. Nesse documento, conhecido mais tarde como a obra “Sobre a Brevidade da Vida”, Sêneca disse que “finalmente, constrangidos pela fatalidade, sentimos que ela [a vida] já passou por nós sem que tivéssemos percebido”. Com o capitalismo, o tempo passou a desempenhar um papel fundamental nas relações econômicas e, consequentemente, um peso sem precedentes sobre a vida das pessoas. Em 1736, nos Estados Unidos, Benjamin Franklin (1706-1790) escreveu: “Lembre-se que tempo é dinheiro. Aquele que pode ganhar dez xelins por dia por seu trabalho e vai passear ou fica vadiando metade do dia, embora não despenda mais do que seis pences durante seu divertimento ou sua vadiação, não deve computar apenas essa despesa; gastou, na realidade, ou jogou fora, cinco xelins a mais.”
Já no século seguinte, a mesma importância que fora atribuída por Franklin ao tempo também foi reconhecida pelo filósofo alemão Karl Marx (1818- 1883), ao elaborar seu conceito de alienação do trabalho. Em sua obra “Elementos Fundamentais para a Crítica da Economia Política”, anterior a “O capital”, ele afirmou que toda riqueza capitalista se baseia no “roubo do tempo de trabalho alheio”.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

O Direito de Morrer - Sociologia/ Filosofia




A vida é um direito, não um dever. Cada indivíduo é dono do seu próprio corpo, e deve ser livre para escolher o destino que pretende dar a ele. O direito à vida inclui e implica no direito de cometer suicídio. Se a sociedade pode obrigar o indivíduo a permanecer vivo apesar de seu próprio julgamento e escolha, então sua vida não lhe pertence, e este indivíduo existe por permissão, não por direito. Ele é um escravo, e nada mais.

O caso recente do poeta italiano Piergiorgio Welby reacendeu o debate sobre a eutanásia e o direito ao suicídio assistido. Ainda que o paciente, de forma totalmente lúcida, tenha desejado morrer, muitos colocaram-se contra seu direito, normalmente alegando motivos religiosos. O caso Schiavo, um pouco mais antigo, gerou bastante polêmica também. Membros da direita conservadora cristã falaram da necessidade de uma “cultura da vida”, reforçando a santidade da vida humana. Mas que vida é esta cultuada, que deve passar por sofrimentos insuportáveis mesmo contra a própria vontade? Indivíduos com doenças incuráveis não teriam o direito de escolher deixar a vida, ficando sujeitos à uma existência de enorme agonia. Seus entes queridos teriam que passar por interminável tortura, convivendo com um corpo não mais vibrante, mas semelhante a um vegetal, assim como Michael Schiavo foi obrigado a ver sua mulher por 15 anos, num estado incapaz de emoção, memória ou pensamento. É esta vida “humana” que deve ser cultuada? Somente se o sofrimento for visto como nobre, e não a felicidade.

O que poderia justificar esta cruzada religiosa por um mundo onde a vida passa a ser uma obrigação, mesmo que um grande fardo, e não mais um direito? Costumam responder que a vontade divina é que deve comandar nossos destinos, já que nossas vidas pertencem a Deus. Não devemos, de forma anti-natural, alterar esse trajeto traçado pelas mãos divinas, não importa o quão insuportável seja a existência. Com “argumentos” deste tipo, muitos no passado foram contra os avanços da medicina, “anti-naturais”, que aliviavam a dor dos vivos. Esses conservadores religiosos não valorizam realmente a vida humana. Seguem um ideal onde viver deve ser um sacrifício, e quanto maior o sofrimento, maior a prova de virtude e devoção ao seu deus. Sacrificar o próprio filho como prova de fé, como Abraão parecia disposto a fazer, eis o que é considerado nobre por essa gente. A adoração ao sofrimento é fundamental ao Cristianismo, uma religião cuja figura central é glorificada por ter morrido de forma horrível pelos pecados da humanidade. Os seus seguidores mais fiéis extrapolam isso para o restante, considerando que viver, mesmo que sob intenso sofrimento, é uma obrigação. Carregar uma cruz a vida toda, eis o leitmotiv da vida para eles. Que os crentes sigam tal crença, tudo bem, é um direito deles. Mas querer impô-la aos que dela não compartilham é um absurdo, um autoritarismo assustador.

A vida humana é sagrada, mas não por conta de alguma declaração supernatural, e sim pela sua natureza única, o glorioso potencial do indivíduo racional de amar, criar, pensar e experimentar prazer. Em resumo, nossa vida é sagrada pela possibilidade de alcançarmos a felicidade aqui nesta vida mesmo. Uma verdadeira “cultura da vida” deixaria o indivíduo livre para perseguir o próprio caminho da felicidade, sem coerção desnecessária ou imposição de algum dogma religioso. Todos devem ter o direito de viver, que abrange inclusive o direito de escolher não mais viver. E se o suicídio é um direito básico, o meio escolhido deve ser um direito também. Por isso cada indivíduo deve ter a liberdade de praticar atos maléficos à sua saúde, assumindo a responsabilidade por tal escolha.

Viver pode ser algo maravilhoso. Mas devemos respeitar quem não compartilha mais dessa opinião, pelo motivo que for. Ninguém deve ser forçado a continuar respirando, mesmo contra a própria vontade, somente porque a vida é “sagrada”. Afinal, a vida é sagrada para aqueles que assim a consideram. Todos devem ter o direito de viver, assim como o direito de morrer.

por Rodrigo Constantino

terça-feira, 16 de setembro de 2008

O santo Guerreiro contra o Dragão da Maldade

Rubem Alves

Sempre tive pena de São Jorge, condenado eternamente a lutar com o dragão, a luta que nunca chega ao fim, criança, eu imaginava que ele deveria ter mulher e filhos e que gostaria de poder voltar para casa, para cuidar das coisas do amor e do prazer. Foi então que um velho contador de estória, especialistas em memórias perdidas, me revelou o terrível segredo. São Jorge brigava com o dragão porque queria. Bem que tinha tido uma chance de terminar com seu suplício sem fim. E relatou:

Era uma vez, há muito tempo, um jovem guerreiro se apaixonara por uma linda donzela. Tão bravo e belo ele era que, das vizinhanças; todas as mulheres por ele se apaixonaram. Inclusive uma bruxa horrenda, que morava nos cenários desertos da lua e que, mesmo daquela distância infinita, com seus olhos telescópicos, havia contemplando o rosto do guerreiro. Mas sus olhos malvados, que tudo viam , viram também o romance do mancebo que passeava, mão dadas com sua amada, por viçosos jardins floridos. A inveja foi imensa, e lá das lonjuras lançou um feitiço: transformou a jovem princesa em dragão.

Mas foi inútil, o bravo Jorge continuo apaixonado por saber que no corpo escamoso morava a sua paixão. Mais furiosa ficou a bruxa e aumentou o feitiço. Decretou que o dragão encantado se transladace para lua, muito longe do apaixonado. Mas Jorge não se deu por vencido. Em noite de lua cheia, montado em seu cavalo, cavalgou no luar, e voou rumo á luz para a sua amada encontrar. Pobre bruxa malvada! Viu-se condenada a ver os dois apaixonados, dragão e guerreiro, bem diante de seu nariz, a namorar. E invocou o seu ultimo feitiço. “Se tu queres a tua amada de volta” ela disse ao mancebo, “Terás de dar-lhe combate. No dia em que o ferires de morte o feitiço se quebrará , e de cadáver do bicho a amada surgirá”.

E foi assim que a briga sem fim entre São Jorge e o Dragão começou. Acontece que São Jorge não acreditou e tinha sempre o temor de que, morto o dragão, morto estaria o amor. E ficou brincando de lutar. E foi por isso que a briga nunca chegou ao fim. Passaram-se os séculos, e daqui da terra se podia ver a briga entre São Jorge e o Dragão.

Acontece, entretanto, que como dizem os marxistas – e com toda razão- é na prática que se molda o pensamento. E depois de tanto lutar, São Jorge acabou por se esquecer o que significava amar. Perdeu-se como amante, congelou-se como guerreiro. Acontece que os deuses, penalizados com tal destino, resolveram desterrar a bruxa para um asteróide distante. Liberto dos olhos da bruxa, o Dragão voltou a ser o que era, a amante. Qual não foi a surpresa de São Jorge, quando, de armadura, lança e espada, pronto para a batalha, ao invés do horrendo Dragão, encontrou-se com a amada, os deuses esperavam sorrindo, este momento feliz. Mas o pobre São Jorge, depois de tanto lutar, já não sabia amar. Não quis tirar a armadura. Tinha vergonha de nudez. Não largou a espada, não deixou sua lança. Não sabia abraçar. Não sabia beijar. E o pobre guerreiro, outrora amante, compreendeu que seu destino, pelos séculos sem fim, era só lutar. Especialista em poder, nada sabia do prazer. E foi assim que orou aos deuses e lhes pediu seu último pedido: Que a linda donzela fosse de novo transformada em dragão. E é por isso que, até que o universo acabe, em noite de lua cheia, veremos o santo guerreiro lutando contra o dragão da maldade.

Estória triste. Dizem que aconteceu na lua.

Eu, ao contrário, penso que aconteceu na rua.

Pois é este o destino daqueles que, forjados na dureza da luta, quando o milagre acontece, descobrem que não sabem o que fazer com a donzela que o espera. Bem dizia Nitzesche, que é preciso o leão transforme em criança, mas que leão, animal forte, quer se ver despido, garras e juba? Melhor o poder que o prazer.

Elegemos o santo guerreiro na esperança que ele soubesse fazer amor. E descobrimos que, de tanto lutar, perdeu a imaginação de amar.

Parábola que dedico, aos santos guerreiros, destinados a lutar contra os dragões da maldade, incapazes de fazer amor com a cidade...

terça-feira, 19 de agosto de 2008

O amor e os limites da comunicação

Por Arthur Meucci

É uma quinta-feira chuvosa. Penso nela. Chego ao meu apartamento cansado. Mais um dia corrido de serviço. Deito-me no sofá e olho pela janela. Sua imagem aparece em minha mente. Posso ver com clareza os belos contornos e a tonalidade de sua cútis. Fecho os meus olhos e sinto uma sensação maravilhosa. O meu rosto esquenta com o toque imaginário do rosto dela. A sensação de seu abraço, que recentemente recebi, ainda é lembrada por todo o meu corpo. O barulho da chuva me hipnotiza. Revivo os momentos em que eu a contemplava de longe. Ah, se ela soubesse o que eu sinto…

Pensar nela é uma sensação que embriaga meu corpo de prazer e felicidade. Ela é a única pessoa que me faz sentir voando nas nuvens com o simples prazer que sua existência me proporciona. Nunca fizemos amor, mas sinto o mais poderoso êxtase afetivo em sua presença. Ao olhá-la, de longe ou de perto, não consigo manter minha mente na realidade. Minha cabeça viaja pelas mais belas fantasias enquanto meu corpo continua interagindo com o mundo.

Meu Deus, o sorriso dela me desmonta. Que divino é seu gesto. Quando ela sorriu pela primeira vez para mim me fez sentir o homem mais feliz do mundo. É impossível relatar o que sinto por ela. É tão forte e intenso que as palavras não dão conta. Não me satisfazem. Ao tentar comunicar os afetos me sinto limitado. Sinto a sensação de que o meu amor esta preso no corpo.

Meu querido filósofo Wittgenstein disse uma vez: “Os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo”. Fico muito triste em saber que um dos pensadores que eu mais admiro tenha levado uma vida tão sem “sabor”, podendo narrá-la sem problemas. Pobre Ludwig. Felizmente, ou não, sua máxima não serve para mim. Sinto cada vez mais que o meu mundo é limitado pela linguagem, e não o contrário. Gostaria de expressar certos sentimentos, mas as palavras são incapazes de explicar. O máximo que eu já consegui falar, após muito tempo, é que sua presença era a causa da minha felicidade e expressei minha gratidão ao senhor da vida por tê-la feito existir. Provavelmente seja o máximo que a filosofia dos afetos possa me dar como discurso.

Não é triste saber que algo tão bom e intenso não pode ser transmitido para outras pessoas? Há muitos anos gostaria de ter dito ao objeto do meu amor que sua existência é tudo de bom para mim. Gostaria que ela pudesse sentir como cada parte do meu corpo fica eufórico só em vê-la. No fundo foi esta frustração que me fez ficar tanto tempo afastado e sem poder me expressar em sua presença. Estudei muito filosofia por causa dela. Queria aprender o que eu sentia e como poderia transmitir tais afetos. Depois de muito estudo descobri que é impossível. Minhas esperanças desabaram frente a esta limitação ontológica. O que eu sinto é meu, só meu, e nunca poderá ser igual em outra pessoa. Ninguém pode sentir ou explicar o que sinto por esta mulher. Toda a humanidade está condenada ao autismo. Acreditar que há pessoas que conseguem exprimir, melhor do que outras, o que vêem ou sentem é mera ilusão. O poeta, no fundo, é um astuto ilusionista. O psicólogo, um ingênuo blefador.

O que eu sinto por ela é só meu. Minhas lembranças, sentimentos e fantasias são tesouros. Um poderoso anestésico frente às agressões do mundo. Esta é a verdade para mim. Algum companheiro filósofo dirá: - O que você sente é simplesmente amor. Sim, é verdadeiramente um amor. Porém, isso não explica nada. Como revelava o sábio Platão, o amor é um desejo. Porém, ele não termina na satisfação momentânea de se ter o ser amado. O amor continua porque desejamos neste instante e no futuro. O amor não acaba com a simples posse do outro, mesmo porque nada nos garante que o outro será sempre nosso. Pois bem, aceito esta definição. Eu a desejo hoje e amanhã sim. Só não estou certo da importância de possuí-la. Além disso, já amei verdadeiramente outras mulheres. Porém, nunca foi igual ao que sinto por ela. O amor que sentimos por uma pessoa nunca é igual ao que sentimos por outra. Não é questão de ser maior ou menor, mas é simplesmente diferente. E o que sinto por ela é muito diferente do que eu senti pelas demais. Para mim não é a mesma coisa.

Muito me espanta que alguns tenham pensado nos afetos de forma lógica e matemática. Há alguns filósofos que dizem que o amor se dá na gratificação que se tem em sentir a felicidade de quem se ama. A pessoa amada é causa de nossa felicidade, e quando quem amamos fica feliz nós também ficamos. Esta lógica parece coerente. Sou feliz com a felicidade dela. Acho que por isso tenho preocupação em fazê-la feliz o tempo todo. Amar o outro, no fundo, é amar a si próprio. Porém, esta mesma filosofia diz que devemos ficar felizes se o objeto amado se tornar feliz com outra pessoa. Se um outro a faz mais feliz do que você, logo é preciso ceder. Assim, você se torna ainda mais feliz. Esta racionalização da mecânica espinosana para mim é um absurdo. Nunca fiquei minimamente feliz em ver quem amo nas mãos de outro. O que as pessoas têm dificuldade em aceitar é que o amor é simplesmente um “desejo”, o desejo é uma “falta”, e a falta requer a “posse” do que não se tem. O mais insano é que, segundo esta lógica dos afetos, alguns diriam que eu não sinto amor por ela. Vejam que até na filosofia há demência…

Por fim, o leitor diria que estou assolado pela paixão. É uma hipótese plausível. A paixão é um vício do espírito e pressupõe algumas coisas. Enquanto no amor o objeto amado é a CAUSA da minha felicidade, na paixão o ser amado é a MEDIDA da minha existência. É o sentimento de que o próprio viver depende do objeto amado. É quando se deixa de viver a própria felicidade para se viver na felicidade do outro. É o que na filosofia epicurista e estóica chamam de “ignorância da razão”. É enxergar no outro a sua própria completude, transferindo assim seus vazios e carências para o objeto amado. Além disso, pressupõe que a pessoa neste estado é incapaz de amar outrem. É um sentimento intenso e terrível. Tive uma paixão que durou dos oito aos catorze anos e com certeza não é nada parecido com o que sinto por ela. Primeiro, a minha felicidade basta em mim mesmo. Não dependo dela para viver a “boa vida”. Segundo, sempre gostei dela e isso não me impediu que eu amasse sinceramente outras mulheres.

Mas o que eu sinto então? Que sentimento é este que ela me produz? Algum dia alguém poderá me explicar satisfatoriamente? Como bom cético pirrônico tenho que dizer “talvez”. Sem afirmar ou descartar. Até lá sigo existindo. Feliz em contemplá-la quando posso, ou sonhando com sua presença. Princesa de Pariquera. Na incapacidade de gratificar meu desejo de amá-la, faço o que em psicanálise se chama de sublimação: canalizo meus impulsos libidinais para uma atividade socialmente aceita. Converto amor em artigos. Afetos em filosofia. Insisto em comunicar ao mundo o incomunicável.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Quem faz a História? - 8ª Série e Ensino Médio

Quem faz a História? (Bertold Brecht)

Quem construiu a Tebas das sete portas?
Nos livros constam os nomes dos reis.
Os reis arrastaram os blocos de pedra?
E a Babilônia tantas vezes destruída
Quem ergueu outras tantas?
Em que casas da Lima radiante de ouro
Moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros
Na noite em que ficou pronta a Muralha da China?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os levantou?
Sobre quem triunfaram os Césares?
A decantada Bizâncio só tinha palácios
Para seus habitantes?
Mesmo na legendária Atlântida,
Na noite em que o mar a engoliu,
Os que se afogavam gritaram por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Ele sozinho?
César bateu os gauleses,
Não tinha pelo menos um cozinheiro consigo?
Felipe de Espanha chorou quando sua armada naufragou.
Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?

Uma vitória a cada página.
Quem cozinhava os banquetes da vitória?
Um grande homem a cada dez anos.
Quem pagava as despesas?
Tantos relatos.
Tantas perguntas.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Intertexto - Ensino Fundamental

Intertexto (Bertold Brecht)


Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Poesia Matematica - Ensino Fundamental e Medio

POESIA MATEMÁTICA (Millôr Fernandes)
Um Quociente apaixonou-se
Um diaDoidamente
Por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base…
Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo ortogonal, seios esferóides.
Fez da suaUma vidaParalela à dela.
Até que se encontraramNo Infinito.
“Quem és tu?” indagou eleCom ânsia radical.
“Sou a soma do quadrado dos catetos.
Mas pode chamar-me Hipotenusa.”
E de falarem descobriram que eram- O que, em aritmética, corresponde
A alma irmãs -Primos-entre-si.
E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz.
Numa sexta potenciação
TraçandoAo sabor do momento
E da paixãoRetas, curvas, círculos e linhas sinoidais.
Escandalizaram os ortodoxos
Das fórmulas euclideanas
E os exegetas do Universo Finito.
Romperam convenções newtonianas
E pitagóricas.
E, enfim, resolveram casar-se.
Constituir um lar.
Mais que um lar.
Uma Perpendicular.
Convidaram para padrinhos
O Poliedro e a Bissetriz.
E fizeram planos, equações e
Diagramas para o futuroSonhando com uma felicidadeIntegral
E diferencial.
E casaram-se e tiveram
Uma secante e três cones
Muito engraçadinhos.
E foram felizes
Até àquele dia
Em que tudo, afinal,
Se torna monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum…
Frequentador de Círculos Concêntricos.
Viciosos.Ofereceu-lhe, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador Comum.
Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais
Um Todo.Uma Unidade.
Era o Triângulo,Chamado amoroso.
E desse problema ela era a fracção
Mais ordinária.
Mas foi então que Einstein descobriu a
Relatividade.E tudo que era expúrio passou a ser
Moralidade
Como aliás, em qualquer
Sociedade.

Millôr Fernandes



Ouça a música Os Números de Raul Seixas.

terça-feira, 22 de abril de 2008

"Preguiça e Gulodice,Uma dupla da pesada" (Texto para todos os alunos do Aldo,ou seja de 5ª à 8ª)

Você está no país dos sonhos onde quem manda é as crianças! Fica por sua conta a hora de desligar a televisão ou o vídeo-game, o tempo de brincar com os amigos e no computador e, o mais legal, a escolha do cardápio para as refeições. Nenhum adulto precisa ser muito esperto para saber que qualquer criança com essa autoridade toda optaria por algo parecido com biscoitos e balas no café da manhã; bolos, hamburgueres e chocolates no almoço; batata frita e sorvete no jantar. Se você concorda inteiramente com essa idéia, cuidado! Lembre-se de que passar o dia de papo pro ar, sem se exercitar, distraído com gibis, jogos eletrônicos e comendo muita guloseima pode fazer com que você engorde ao ponto de se tornar obeso.

"Parado não dá pra ficar"

Normalmente, as crianças obesas não acompanham os amigos nas brincadeiras que envolvem o pular, correr e outras atividades físicas. A falta de exercício é uma das maiores vilãs no desenvolvimento da obesidade infantil, porque o açúcar da alimentação pode se converter em gordura, fazendo com que a pessoa engorde e até corra o risco de ter problemas no coração. Praticar esportes é uma ótima alternativa para se manter saudável. Sem falar que o exercício físico também influencia o nosso humor, nos deixando mais bem dispostos e alegres. Ao contrário, quando se está obeso, a gente acaba não se sentindo bem com o próprio corpo, podendo até levar uma vida triste. Quando isso acontece, tanto para cuidar da obesidade quanto para tratar do sentimento de infelicidade, o melhor que se pode fazer é procurar a ajuda de um profissional da saúde.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

A arte de ler - TEXTO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA TODAS AS TURMAS

Sobre o hábito da leitura
por Ana Miranda
Nessas viagens que faço pelo Brasil, professoras e professores me pedem sugestões para melhorarem os índices de leitura de suas crianças. Então, tenho pensado nisso. Vejo o esforço dos professores, levando as crianças à biblioteca, promovendo sessões de leitura, chamando contadores de histórias... o esforço dos pais, comprando, muitas vezes com sacrifício, livros para seus filhos; e o esforço dos governos, distribuindo livros, provendo bibliotecas (o governo federal é o maior comprador de livros em nosso país). Há um projeto em andamento que prevê a criação de bibliotecas, mais de mil, em cidades que não as têm. É importante tudo isso. Mas não muda a situação. A situação da leitura no Brasil é muito precária, e nem é preciso dizer aqui as conseqüências dessa nossa debilidade. Todo o conhecimento acadêmico da humanidade está nos livros. É preciso ler, e saber ler. Nesses países chamados de Primeiro Mundo, a média de leitura é de dez livros por ano, a cada habitante. Na França, cada pessoa lê, em média, 25 livros por ano. No Brasil, pouco mais de um livro por ano, por brasileiro. O nosso paradoxo: dizem que as pessoas não lêem porque os livros são caros, mas os livros são caros porque as pessoas não lêem, as tiragens são pequenas e o custo é mais alto, por exemplar. Essa é uma explicação simplista. A questão é cultural, profunda, vem desde nosso passado colonial. Creio que é muito difícil tornar um adulto não leitor em leitor. Seria preciso fazer uma longa e massiva campanha, como vem sendo feita, há décadas, pela mudança nos hábitos relativos à saúde física. Um esforço de diversos setores da sociedade, como médicos, imprensa, poderes públicos, com resultados visíveis. Mas nunca houve algo parecido, no que toca a leitura. As campanhas são isoladas, restritas. Mas é muito fácil tornar uma criança em leitora. As crianças costumam adorar os livros, as histórias, as ilustrações, têm sede de conhecimento, de fantasias e descobertas, estão em fase de formação, e de adquirir os gostos e hábitos que as acompanharão por toda a vida. A solução seria introduzir no currículo escolar a matéria leitura. Uma matéria agradável, de baixo custo e grande rendimento, que não precisa de novos professores, nem de professores especializados. Basta instruir os professores: leiam com as crianças, todos os dias. O livro deve estar presente, ali perto, ao alcance da mão. É preciso haver em cada sala de aula uma estante com livros, e que todos os dias as crianças fiquem, por um tempo qualquer, meia hora, uma hora, lendo ou ouvindo a leitura, manuseando livros, olhando-os, criando intimidade e amizade com o livro. Todos os dias. E um livro deve ser levado para casa, diariamente, a fim de que os pais promovam também um horário de leitura, todos os dias, mesmo que por apenas meia hora – o que pode ser medido por um questionário a ser preenchido pelos pais: quantos minutos a criança teve de leitura? leu sozinha? leu em voz alta? teve alguma dificuldade em alguma palavra? Não importam tanto as perguntas, o que importa é o envolvimento dos pais no processo. O processo é o de trazer o livro para o cotidiano, ele deve fazer parte da rotina, tanto na escola como em casa. Não basta gostar, é preciso ter o hábito.
Ana Miranda é escritora, autora de Boca do Inferno, Desmundo, Amrik, Dias & Dias, entre outros livros. www.anamirandaliteratura.hpgvip.com.br

segunda-feira, 7 de abril de 2008

UM AMBIENTALISTA NO SÉCULO XXI: POR FAVOR, NÃO DEFENDAM A NATUREZA! - Para todos os alunos do SERRANO



















UM AMBIENTALISTA NO SÉCULO XXI: POR FAVOR, NÃO DEFENDAM A NATUREZA!
Dener Giovanini

Durante uma palestra no ano passado, na cidade mineira de
Uberlândia, fiz uma provocação à platéia: disse em alto e bom som que quem realmente se preocupa com a natureza deveria parar de tentar defendê-la. É claro que não dei chance para o auditório se manifestar. As reações seriam bem previsíveis, pois eu estava ali a convite da OPA – Organização de Proteção Ambiental, uma entidade reconhecida por sua forte atuação na defesa ambiental. E a dita platéia, cerca de 150 pessoas, era em sua grande maioria, formada por ativistas da instituição. Assim que comecei a perceber que, subitamente, os assentos das cadeiras começaram a incomodar as pessoas, entendi que quem iria precisar de proteção naquele momento era eu. Socorri-me chamando à frente o presidente da organização, Juscelino Martins que, além de ser um dos mais respeitados empresários desse país, é uma daquelas pessoas que impõe a sua presença através das suas credenciais como ambientalista de visão arrojada e sensata. Com ele ao meu lado, senti-me mais seguro para explicar aquela frase espinhosa que eu tinha acabado de jogar sobre a platéia.A razão que temos para não defender a natureza é muito simples. Não podemos defender quem é mais forte que nós!



E citei, naquele momento, um exemplo prático quem ali se sentira à vontade para aceitar o cargo de segurança do Michel Tyson? Como você pode querer defender alguém ou algo que é muito mais forte que você?Eis ai a chave que talvez abra a porta de um novo mundo. Uma nova compreensão do que de fato somos e do que representamos na complexa engrenagem da vida sobre esse planeta. A nossa essência humana é dominadora. Em nossa história evolutiva sempre buscamos dominar povos e culturas. De uma forma ou de outra, em nossas relações pessoais ou nas relações entre as nações, invariavelmente buscamos impor a nossa individualidade e, principalmente, a nossa mentalidade de conquistador, de senhores da razão. E assim sempre foi a nossa relação com a natureza. O ser humano sempre enxergou a natureza como uma coisa menor que ele. Mais fraca. Menos importante. O meio ambiente sempre foi um desafio a ser vencido. Conquistado. Repetimos com a Mata Atlântica a relação que os nossos colonizadores mantiveram com os índios que aqui encontraram. Num primeiro momento tentou-se torná-los úteis aos anseios conquistadores. Subjugá-los a força era a meta.



Como a prática mostrou-se complicada, passou-se ao plano B: eliminá-los. Da floresta inicialmente também se buscou torná-la útil, extraindo o que fosse possível. Como da carcaça que dela sobrou também nada mais se aproveitava, o passo seguinte também foi eliminá-la.E assim continuamos soberanos em nossa missão de dominar o mundo. De impor a nossa presença. De reinar sobre tudo e sobre todos. Na história recente do mundo multiplicaram-se os defensores do meio ambiente. Surgimos – e aqui me coloco entre eles – como surgem os irmãos mais velhos quando entram numa briga para defender seu irmãozinho ameaçado. Ficam lá, de um lado o ameaçador, de outro o defensor, e no meio a natureza. Mesmo inconscientes, nós ambientalistas, estamos reproduzindo o padrão comportamental que deveríamos combater. Nós também enxergamos o meio ambiente como algo fraquinho e frágil, que precisa da nossa “ajuda” para sobreviver. Não compreendemos ou não enxergamos que a nossa própria atitude, gestos e atos apenas reforçam a idéia de que somos supremos em nossa existência sobre a terra. Amplificamos com as nossas palavras o conceito de dominação ancestral do homem sobre a natureza. O momento atual nos exige uma reflexão profunda. Um mea culpa. Está na hora de mudar o discurso de irmão mais velho. Vamos entrar na briga sim, mas para dizer: olha, se você se meter com o meu “irmãozinho” você vai se dar muito mal, pois ele é violento, perigoso, tem três metros de altura e está armado até os dentes. Enfim, mudar a nossa postura de supremacia diante da natureza e adotar um comportamento inteligente. Entender de vez que a natureza não precisa da nossa defesa. Reconhecer com humildade a sua força e poder. Colocar-nos em nosso devido lugar.

Compreender que o fraco nessa história somos nós, humanos. Comprar uma briga com a natureza é de uma extrema burrice.




















Achar que a controlamos ou que a dominamos é talvez um dos maiores erros que a humanidade já cometeu. Seremos varridos da face da terra com a mesma facilidade que limpamos a sujeira que nos incomoda em nossa casa: com água, com vento ou com calor. No fundo devemos apenas compreender que essa briga já está ganha. E não por nós.Um dia conseguimos superar a nossa “guerra fria”. Agora é a vez da “guerra quente”. Só que os protagonistas não são apenas dois países disputando entre si quem tem mais poder de fogo. A peleja agora é outra. Somos nós contra o planeta. É uma espécie contra milhões. É a luta de quem produz fumaça contra quem detém vulcões. A partir de hoje eu não quero e não vou mais defender o meio ambiente. Vou apenas temê-lo e por isso, respeitá-lo. Vou tentar entender o que a natureza está dizendo e buscar difundir suas palavras que, se pudessem ser materializadas, soariam mais ou menos assim:
RESPEITE-ME. POR QUE RESPEITO É BOM E EU GOSTO!




*Dener Giovanini é ambientalista e coordenador geral da Renctas.


TERRA para AMAR - Vídeo

TERRA para TEMER - Vídeo

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Abraço a todos

segunda-feira, 24 de março de 2008

Um Homem de Consciência - Texto para 2º e 3º anos do Ensino Médio

Chamava-se João Teodoro, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro.
Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer o que todos ali queriam: mudar-se para terra melhor. Mas João Teodoro acompanhava com aperto do coração o desaparecimento visível de sua Itaoca.
"Isto já foi muito melhor", dizia consigo. "Já teve três médicos bem bons - agora um e bem ruinzote. Já teve seis advogados e hoje mal dá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente, a minha Itaoca está se acabando..." João Teodoro entrou a incubar a idéia de também mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível.
"É isso", deliberou lá por dentro. "Quando eu verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada, então arrumo a trouxa e boto-me fora daqui."
Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notícia como se fosse uma porretada no crânio. Delegado ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não queria ser nada, se julgava capaz de nada... Ser delegado numa cidadezinha daquelas é coisa seríssima. Não há cargo mais importante. É o homem que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o governo. Uma coisa colossal ser delegado - e estava ele, João Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!...
João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou-as num burro, montou seu cavalo magro e partiu.
- Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens?
- Vou-me embora - respondeu o retirante. - Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim.
- Mas, como? Agora que você está delegado?
- Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado eu não moro.
Adeus.
E sumiu.
Monteiro Lobato

Conceito de Literatura - Texto para 1º Ano Ensino Médio

Sabemos que o reino das palavras é farto. Elas brotam de nosso pensamento de maneira natural, não temos a preocupação de elaborar o que dizemos ou até mesmo escrevemos. As palavras, contudo, podem ultrapassar seus limites de significação. Podendo assim, conquistar novos espaços e passar novas possibilidades de perceber a realidade. O caminho que a literatura percorre é este. O artista sente, escolhe e manipula as palavras, as organiza para que produzam um efeito que vá além da sua significação objetiva, procurando aproxima-las do imaginário. A obra do escritor é fruto de sua imaginação, embora seja baseado em elementos reais. Da concretização desse trabalho surge então a obra literária. Dotado de uma percepção aguçada, o escritor capta a realidade através de seus sentimentos. Explora as possibilidades lingüísticas e as manipula no nível semântico, fonético e sintático. A literatura é uma manifestação artística. E difere das demais pela maneira como se expressa, sua matéria-prima é a palavra, a linguagem. O texto literário se caracteriza pelo predomínio da função poética. Observe, no poema Procura da poesia, como o poeta Carlos Drummond de Andrade descreve o escritor entrando no “reino das palavras”. Procura da poesia Não faças versos sobre acontecimentos. Não há criação nem morte perante a poesia. Diante dela, a vida é um sol estático, não aquece nem ilumina. As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam. Não faças poesia com o corpo, esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica. Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro são indiferentes. Nem me reveles teus sentimentos, que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem. O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia. Não cantes tua cidade, deixa-a em paz. O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas. Não é música ouvida de passagem; rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma. O canto não é a natureza nem os homens em sociedade. Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam. A poesia (não tires poesia das coisas) elide sujeito e objeto. Não dramatizes, não invoques, não indagues. Não percas tempo em mentir. Não te aborreças. Teu iate de marfim, teu sapato de diamante, vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável. Não recomponhas tua sepultada e merencória infância. Não osciles entre o espelho e a memória em dissipação. Que se dissipou, não era poesia. Que se partiu, cristal não era. Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos. Estão paralisados, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície inata. Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam. Espera que cada um realize e consuma com seu poder de palavra e seu poder de silêncio. Não forces o poema a desprender-se do limbo. Não colhas no chão o poema que se perdeu. Não adules o poema. Aceita-o como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço. Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a chave? Repara: ermas de melodia e conceito elas se refugiaram na noite, as palavras. Ainda úmidas e impregnadas de sono, rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

terça-feira, 4 de março de 2008

Texto de Filosofia para todas as séries - Half-Life Counter Strike

Por Arthur Meucci
Tenho um irmão que há dois anos atrás comprou um jogo chamado Half-Life Counter Strike. Fascinado por jogos eletrônicos ele adorava este jogo de tiro em primeira pessoa onde você pode ser um terrorista protegendo seus reféns ou um anti-terrorista que deve resgatá-los. Claro que o único meio empregado é o uso da violência. Como todo intelectual mané vi neste jogo uma propaganda estadosunidenses para engajar os jovens nas atuais geopolíticas militares, como fazem os outros produtos culturais que são trazidos de lá.
Como irmão e cidadão eu somente o adverti para as questões subjacentes e ocultas que este tipo de jogo trazia. Cumpri meu papel. Em nenhum momento tentei coagi-lo para desinstalar o programa e devolver o produto na loja. Afinal, ele é maior de idade, goza do pleno uso da razão, e comprou o produto com dinheiro próprio. Como filósofo consciente não posso admitir que minha vontade, e minhas crenças, se sobreponham a liberdade de outrem, desde que a ação não me prejudique.
Pois bem, ao andar pela Avenida Paulista após o Carnaval me deparo com uma manifestação em frente ao MASP. Naquele lugar havia uma concentração de pessoas um tanto estranhas, com cartazes que a primeira vista eram enigmáticos, pedindo a liberdade de comprar um jogo. Ao chegar perto percebo que se trata do bom e velho Counter Strike. Segundo os manifestantes um juiz da Vara Federal de Seção Judiciária, em Minas Gerais, acatou o pedido do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor de proibir a venda deste jogo e de um outro chamado Everquest (que não faço idéia do que seja).
Abismado com o que ouvi dos manifestantes comecei a me questionar: o que poderia legitimar o judiciário ou o Estado em restringir minha liberdade de comprar um jogo? Ou melhor, em que circunstâncias o Estado pode interferir na minha liberdade individual? As palavras do bom e velho filósofo Stuart Mill ressoavam por todo o meu cérebro.
Sabemos que vivendo em sociedade nossa liberdade pode ser limitada pelas “funções de polícia”, ou seja, que podemos perdê-la em parte ou totalmente no intuito de prevenir crimes ou acidentes. Segundo o senso comum é preciso estabelecer certas regras e limitações para se viver em sociedade. Se, por exemplo, todos pudessem ter um carro e correr com ele pela rua, sem nenhum limite, a vida de motoristas e pedestres estaria ameaçada. Mas então, por que não se proíbe a venda de carros? Ora, eles são úteis quando usados corretamente e podem salvar vidas em casos de emergência. Assim, se justificaria as leis de transito e a função de polícia para proteger a segurança de motoristas e pedestres.
Pois bem, em que medida nos proibir de comprar estes jogos se enquadram na função de polícia? Vamos analisar os argumentos. O juiz avaliou que os jogos “trazem imanentes estímulos à subversão da ordem social, atentando contra o Estado democrático e de direito e contra a segurança pública”[1]. A acusação frisou que o jogo potencialmente (em outras palavras, “hipoteticamente”) pode causar distúrbios comportamentais de característica agressiva quando menores de idade se expõe por muito tempo ao jogo.
O que significaria “trazer imanentes estímulos”? Por imanente, neste caso, significa “em essência”, ou seja, que está contido no jogo. Mas o que ele conteria? Um estímulo. Em outras palavras, induzir um provável comportamento no jogador. Comportamento que, segundo o juiz, poderia produzir uma subversão da ordem social. Subentendesse o desacato às leis e aos órgãos de segurança. Perceba que em nenhum momento ele afirma que o jogo produz esta tendência nociva, mas que provavelmente ele pode induzir ao crime. O álcool sabidamente leva as pessoas que o consome em excesso a subverter a ordem. Ele certamente produz um estímulo maior que o jogo. Por que então não proibir a venda de álcool? Nunca soube de alguém que tenha matado após jogar este jogo, porém de bêbados sim. Qual a significativa diferença que os separa e que torna o jogo mais perigoso?
O argumento da acusação de que jogo poderia, em hipótese, causar distúrbios comportamentais em menores com alta exposição ao mesmo também não parece convencer. Artes marciais, pintball, e filmes como Tropa de Elite causam mais estímulos agressivos do que o jogo em questão. Por que então não proibi-los? Alguns dirão que os pais têm o direito e a liberdade de escolher se seus filhos podem ou não ir ao pintball ou assistir um filme violento. Afinal, sãos os pais que conhecem e educam suas crianças. Então, por que não exigir somente que o jogo tenha uma advertência sobre seus efeitos colaterais e restringir a venda para menores de idade? Não é mais fácil cobrar o pai e pedir que ele assine um termo de consentimento para que o filho possa jogar os jogos em casa ou na lan house?

As contra-respostas para estas questões são muito mais reveladoras. Eles dirão que há dois problemas que atenuam o caso. O primeiro é a comercialização ilegal de jogos. O comércio de programas piratas e lan houses sem fiscalização poderiam oferecer o jogo para menores sem exigir autorização. Perceba então que o Estado afirma que é INCAPAZ de exercer a função de polícia contra o crime de pirataria e de fiscalizar estabelecimentos irregulares. Além disso, se mostra incapaz de oferecer uma educação pública e de qualidade em que se possa ter um espaço para ensinar os jovens os problemas trazidos pelos jogos e pelo comércio ilegal de programas. Como é ineficiente no combate ao crime, o Estado simplesmente abusa de seu poder e restringe nossas liberdades. É muito mais fácil nos limitar do que resolver os problemas. Fórmula simples de todo Estado totalitário e/ou reacionário.
O segundo argumento é a perda de autoridade por parte dos pais. Segundo esta perspectiva muitos pais não conseguem educar e impor limite aos filhos, logo isso abre brecha para que estes menores desobedeçam e achem um jeito de jogar. Assim, filhos responsáveis e adultos têm seus direitos negados pela INCOMPETÊNCIA de pais que não educam corretamente sua prole. Mais uma vez pais irresponsáveis jogam para o Estado a responsabilidade de proteger e controlar seus filhos, se eximindo de suas obrigações.Notamos nestas duas questões que as autoridades, ao invés de exercerem corretamente a ação de polícia para combater o crime e nos proteger, abusam de suas forças e ferem nossa liberdade. E ai a velha questão se coloca: É legítimo deixar uma pessoa fazer algo potencialmente perigoso, como jogar este jogo? Depende. Se a pessoa estiver desavisada sim, pois a liberdade consiste em se fazer o que deseja, e ninguém deseja ter distúrbios mentais com o jogo. Porém, se a pessoa foi avisada dos riscos que o jogo pode trazer, e esta de plena posse da razão (não sendo um louco, um drogado, ou uma criança), cabe a ela decidir o que fazer. Respeitar sua liberdade de escolha. Sua liberdade individual.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

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